Nesta mesma terça-feira em que chefes de Estado de 33 países, incluindo a presidente Dilma Rousseff, participavam da abertura e dos encontros de trabalho da II Cúpula da Comunidade dos Estados Latinoamericanos e Caribenhos (Celac), em Havana, a blogueira e ativista política Yoani Sánchez postava em seu site (Generación Y) um novo comentário sobre a “operação limpeza” feita pelo governo dos irmãos Castro na capital cubana para receber as autoridades. O encontro de cúpula, que prosseguiu nesta quarta-feira, tem como tema principal as ações contra a pobreza, a fome e as desigualdades na América Latina e Caribe.

Enquanto isso, como expõe Yoani, pobres e mendigos de Cuba foram escondidos, ruas passaram por uma limpeza às pressas e casas ganharam uma nova mão de tinta. Além disso, como lembra a blogueira, ativistas contra a ditadura cubana foram presos ou ameaçados, tudo para que não houvesse nenhum transtorno aos presidentes que lá se encontram. “A verdadeira Havana se dissimulou em outra cidade, como se por sobre a sujeira acumulada por décadas fosse colocado um tapete colorido e efêmero”, disse Yoani Sánchez.

Leia abaixo o comentário da blogueira Yoani Sánchez, já traduzido do espanhol:

“Rua Infanta e Vapor, oito da noite. Um andaime range sob o peso de seus ocupantes. A área é escura, mas dois pintores ainda gastar seus pincéis por varandas sujas, fachadas, pelas largas colunas de frente para a avenida. O tempo é curto, a Segunda Cúpula das CELAC começaria em apenas algumas horas e tudo precisa estar pronto para os hóspedes. As ruas onde caravanas presidenciais transitam serão retocadas, o asfalto reposto, os buracos tapados e a pobreza, escondida. A verdadeira Havana se dissimulará em outra cidade, como se por sobre a sujeira acumulada por décadas fosse colocado um tapete colorido e efêmero.

Depois chegará a ‘limpeza humana’. Os primeiros sinais de que um outro cenário está montado é dado pelos telefones celulares. As chamadas são perdidas no nada, mensagens de texto não chegam ao seu destino, os enervantes sons de ocupado aparecem quando se tenta comunicação com um ativista. Em seguida, vem a segunda fase, a física. Nos cantos de certas ruas proliferam supostos casais que não falam, homens com camisas xadrez a tocar nervosamente o fone de ouvido na orelha sorrateira, vizinhos que são colocados em guarda do lado de fora dos portões daqueles a quem ontem pediram um pouco sal. Toda a sociedade está cheia de sussurros, olhos atentos e medo, uma grande dose de medo. A cidade está tensa, em estado de alerta: começou a Cúpula da CELAC.

A última fase inclui detenções, ameaças e prisões domiciliares. Enquanto isso, as emissoras oficiais sorriem, comentam as conferências de imprensa e movem suas câmeras escadas pelas escadarias de dezenas de aeronaves. Há tapetes vermelhos, pisos polidos e samambaias no Palácio da Revolução, além de brindes, fotos de famílias, tráfego desviado, policiais de trânsito a cada cem metros, guarda-costas, comitês de imprensa, declarações de abertura, pessoas advertidas, masmorras repletas, amigos desaparecidos. Nem na refinaria Nico Lopez é permitido mostrar a fumaça suja que sai da chaminé. O postal retocado de Havana está pronto … mas falta-lhe a vida.

Então, depois, tudo passa. Cada presidente e cada chanceler volta para sua casa. A humidade e a sujeira brotam sob a fina camada de tinta nas paredes. Vizinhos que participaram da operação retomam o seu tédio e os oficiais da ‘Operação Limpeza’ os recompensam com diárias em hotéis com tudo incluído. Plantas semeadas para o encontro de cúpula secam por falta de água. Tudo volta ao normal ou para a completa falta de normalidade que caracterizou a vida cubana.

O falso instante acabou. Adeus CELAC 2014.”

(Postado por Eduardo Mota – Assessoria de Imprensa)